Esta plantação trará algo para Demorvan e Rejane? Espero que sim. Enquanto isso, há um solo fértil sendo preparado lá. As comunidades não estão morrendo de fome e pararam de ver suas terras se transformarem em deserto.
Em janeiro de 2019, a The Forest Trust se tornou a Earthworm Foundation.
Belém do Pará, Brasil, 10 de novembro: Depois de passar dois dias em reuniões com a nossa equipe no Norte do Brasil, vamos visitar uma “pequena” plantação de 1.000 hectares, onde a empresa com a qual trabalhamos em Belém, a Pampa, está atuando.
Os proprietários da Pampa, Rejane e Demorvan, vêm nos buscar no hotel às 6h45 e toda a equipe da TFT Norte do Brasil se junta a nós: Camila e Andresa, que desde o início estão trabalhando com a empresa para melhorar a forma como se obtém a madeira, e Rossynara, que conhece a região como a palma da sua mão, pois tem trabalhado nela durante toda a sua vida e é responsável pelo que fazemos no projeto que vamos visitar.
Há também um rapaz, recém-contratado, Rodrigo, que se mudou há duas semanas de seu Estado de origem, no Sul do Brasil, pois decidiu “trabalhar pela floresta amazônica com a TFT”. Portanto, três mulheres no total, duas delas grávidas (sei que serei repreendido por isso, mas elas insistiram), em um sábado, porque elas também queriam visitar o projeto e conhecer melhor o trabalho de sua colega. Não é um clima ruim para começar o dia!
No caminho, conheci melhor Demorvan e Rejane, que não são apenas parceiros nos negócios, mas também marido e mulher. Eles possuem e administram uma das maiores operações madeireiras do Pará e fabricam produtos para pisos e decks que são exportados para todo o mundo (principalmente para os EUA e a Europa), para serem usados em casas, terraços, etc. Você, que está lendo este artigo, pode muito bem já ter pisado mais de uma vez em um dos itens produzidos por deles.
É a primeira vez que me encontro com eles, embora já tenha ouvido falar muito sobre o trabalho que realizamos com a Pampa: De fato, a equipe da TFT tem realmente trabalhado com os fornecedores da empresa para garantir que “façam a coisa certa”, como Demorvan gosta de dizer. A coisa certa no Pará é, em resumo, um gerente florestal planejar o manejo da floresta para não a destruir, garantindo que as pessoas (trabalhadores e comunidades) se beneficiem dela. E isso pode ser um desafio: condições de trabalho precárias para os trabalhadores e exploração excessiva de certas espécies são a norma na região e levaram à degradação da maioria das florestas naturais exploradas até agora. “Todo mundo faz isso” é a desculpa usual.
Mas Rejane e Demorvan têm uma visão diferente. “Somos um dos atores da cadeia, entre os nossos fornecedores e os nossos clientes. Temos a responsabilidade por todas as pessoas que estão envolvidas nessa cadeia.” Geralmente, é Demorvan quem compra a madeira e está ativamente incentivando seus fornecedores a gerenciarem áreas florestais, mudando não apenas a maneira como cortam a madeira, mas também como interagem com as comunidades vizinhas. No papel, isso parece idealismo. Mas, na realidade, é factível. As “meninas” da TFT fazem isso todos os dias. Recentemente, elas ajudaram dois dos fornecedores de Demorvan a receber a Certificação FSC. E isso é um verdadeiro sucesso em um ambiente tão desafiador.
Enquanto Demorvan se concentra em dirigir para lidar com os inúmeros movimentos aleatórios de caminhões e pedestres, Rejane me conta mais sobre o projeto que vamos visitar: ela diz que, embora não sejam proprietários das áreas florestais de onde obtêm a madeira, eles adquiriram, paralelamente, 1.000 hectares em uma área muito pobre há alguns anos para replantar teca, paricá, mogno e outras espécies. Demorvan a interrompe para acrescentar detalhes e elementos, e ela se irrita. Mas sempre termina com um sorriso: eles estão ansiosos para compartilhar todos os detalhes do que fazem e têm a mesma paixão.
Quando chegamos, saímos dos carros e olhamos as árvores. Algumas têm 15 anos e não consigo acreditar no tamanho de várias delas. Encontramos o engenheiro florestal, Mauro, que vive aqui desde o início. Ele nos conta com paixão o que faz todos os dias e como está coletando dados sobre o solo (que ele publicou em um livro - Manual de Reflorestamento, de Mauro dos Santos Carvalho), como as espécies se comportam e quais técnicas de manejo usar... Ninguém havia feito esse trabalho antes. Não há dados científicos sobre a região. Ele nos diz que, às vezes, algumas árvores morrem depois de quatro anos, e ninguém sabe o porquê... Talvez, suas raízes tenham atingido um limite rígido no solo e não puderam crescer mais? É claro que ainda temos muito a aprender sobre a natureza...
O que mais me impressiona é a natureza do solo. É areia pura, e onde não há árvores, não há nada. Apenas calor seco e poeira. De fato, a um passo do deserto. De vez em quando, paramos na estrada e caminhamos sob a cobertura das árvores com Demorvan. É verde e mais fresco. Há muitas espécies e posso ver alguns pássaros amarelos voando ao nosso redor. Também há barulho. O solo é feito de folhas, galhos e grama que estão se decompondo muito bem para formar uma camada de solo preto, úmido e fértil. Sem essas árvores, não haveria solo. Não haveria vida. Não haveria agricultura. “Nada cresce aqui”, como as pessoas costumam dizer na região. Sem essas árvores, também não haveria empregos, nem dinheiro para as pessoas da região. Os 1.000 hectares provavelmente não são lucrativos naquela região, mas são um laboratório fantástico para o futuro.
Rejane está encarregada do trabalho aqui e, junto com Rossynara da TFT e outra senhora, especialista da comunidade (Ione), elas têm a ambiciosa meta de certificar essa plantação pelas melhores práticas de manejo. Mas não se trata apenas de aplicar um padrão: “O FSC nos diz que devemos controlar a área em que plantamos, mas eu não me importo! Mandei retirar todas as cercas porque acho que os moradores não deveriam ser proibidos de andar nessas áreas para coletar frutas das mangueiras que nos restaram, caçar ou pescar, como sempre fizeram”, diz Rejane.
Isso me mostra mais uma vez que esse espaço para inovação, em nível local, é indispensável em qualquer iniciativa de sustentabilidade. Grandes princípios como os do FSC são um guia e uma referência úteis, mas devem deixar espaço para a inovação e ser mais abertos a ela. “Deveríamos estar nos adaptando às pessoas que vivem aqui há anos, e não elas à nossa plantação”, ela acrescenta. Isso é senso comum básico, e me parece muito correto.
Essa plantação trará algo para Demorvan e Rejane? Espero que sim. Mas não tenho certeza, pois ela é pequena e, de certa forma, ainda experimental. Mas eles sabem que estão fazendo a coisa certa, e nós também sabemos, os ajudando em sua jornada.
Enquanto isso, há um solo fértil sendo preparado lá. As comunidades não estão morrendo de fome e pararam de ver suas terras se transformarem em deserto.
Sinto-me profundamente orgulhoso pelo fato de a TFT ser parceira de pessoas como Rejane e Demorvan. Também me sinto humilde por eles confiarem em nós e verem valor em nossos conselhos.
De volta ao meu hotel em Belém, fui tomado por um sentimento de esperança: o que fazemos com Rejane e Demorvan NÃO é uma gota no oceano. Fazemos parte de um movimento de mudança mais amplo e profundo. Rejane, Demorvan, Mauro, as meninas do TFT, Ione e Rodrigo estão, todos os dias, inspirando e ajudando mais pessoas a mudar a maneira como fazem negócios para servir melhor à VIDA. E amanhã vamos inspirar mais pessoas: governos, outras empresas, bancos, fundos de pensão e gerentes a embarcarem nessa jornada também.